Resumo: Viagem - Vaga Música - Cecília Meireles
Livros inaugurais da maioridade poética de Cecília Meireles, Viagem e Vaga música, publicados respectivamente em 1936 e 1942, inscrevem-se no panorama do Modernismo brasileiro e assinalam sua singularidade primordial. São poemas marcados pela engrandecimento dos elementos mais simples da existência, os quais adquirem significação simbólica.
Poetisa da fugacidade, da precariedade, da provisoriedade, Cecília Meireles, desde o título Viagem, passando pelo de Vaga Música - a música como percurso temporal -, marca essa noção capital de fluidez em vários dos elementos da natureza que surgem ao longo de sua poesia, dentro de um fluxo mais amplo que é o do próprio canto .
Cecília Meireles ingressou nas letras como uma escritora neo-simbolista, junto com alguns amigos poetas da revista Festa. Até depois de se afastar destes poetas, seus poemas ainda se relacionavam com fantasias, sonhos, solidão, padecimento, e melancolia. Seus poemas valorizam ainda coisas como símbolos, imagens sugestivas e constantes apelos visuais. Sua poesia manteve-se presa ao lirismo de tradição portuguesa. Herdando e ao mesmo tempo depurando a linguagem musical e cadenciada do simbolismo e seu lirismo transformaram em belos poemas a sua melancolia e o sentimento da saudade do tempo que passou. Concentrou sua sensibilidade poética na reflexão sobre a fugacidade da vida: a descrição real, a expressão sensorial, ou o questionamento do mundo material. Apresenta certa fixidez temática nas alusões ao espaço (privilégio do mar e da água). Profundo senso de solidão.
Suas características são: fuga para o sonho, preocupação com a falta de sentido da existência, ênfase à condição solidária do ser humano.
Poemas escolhidos: MOTIVO
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico.
ou passo.
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico.
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
HERANÇA
Eu vim de infinitos caminhos,
e os meus sonhos choveram lúcido pranto
pelo chão.
e os meus sonhos choveram lúcido pranto
pelo chão.
Quando é que frutifica, nos caminhos infinitos,
essa vida, que era tão viva, tão fecunda,
porque vinha de um coração?
essa vida, que era tão viva, tão fecunda,
porque vinha de um coração?
E os que vierem depois, pelos caminhos infinitos,
do pranto que caiu dos meus olhos passados,
que experiência, ou consolo, ouprêmio alcançarão?
do pranto que caiu dos meus olhos passados,
que experiência, ou consolo, ou
Viagem é composto por doze poemas, que podem ser interpretados como doze etapas de uma trajetória espiritual, onde vida e poesia se confundem, da mesma maneira que a poeta e a natureza. Formalmente, convivem lado a lado versos de sete e oito sílabas e versos livres.
Poema escolhido: VIAGEM
Fez tanto luar que eu pensei em teus olhos antigos
e nas tuas antigas palavras.
O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos
que tornei a viver contigo enquanto o vento passava.
e nas tuas antigas palavras.
O vento trouxe de longe tantos lugares em que estivemos
que tornei a viver contigo enquanto o vento passava.
Houve uma noite que cintilou sobre o teu rosto
e modelou tua voz entre as algas.
Eu moro, desde então, nas pedras frias que o céu protege
e estudo apenas o ar e as águas.
e modelou tua voz entre as algas.
Eu moro, desde então, nas pedras frias que o céu protege
e estudo apenas o ar e as águas.
Coitado de quem pôs sua esperança
nas praias fora do mundo...
- Os ares fogem, viram-se as água,
mesmo as pedras, com o tempo, mudam.
nas praias fora do mundo...
- Os ares fogem, viram-se as água,
mesmo as pedras, com o tempo, mudam.
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